domingo, 4 de dezembro de 2011

Escrevendo Romance VI: 6ª Parte

CAVALEIROS E EXORCISTAS
©2011 Paulo Af.
Esta obra é uma ficção, não tem dados históricos oficiais reais e todos os personagens são fictícios, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência

EDIFICANDO UMA IGREJA

Seguimos os guaranis com cautela, pois não sabíamos de suas reais intenções. No fundo ainda duvidávamos das intenções de Buldica, que por ser muito forte e arredia poderia querer nos matar, como prometera quando nos encontramos no inicio, quando chegamos a ilha. Com firmeza nas caminhadas ela seguia os guaranis sem suspeitar de nada. Quando demos mais uns vinte passos, talvez, o guarani parou e se virou para ela.
Disse em sua língua estranha, e depois Buldica traduziu o que dissera assim: ‘O guarani disse que estamos perto de sua aldeia. Ele quer que vós desçais de suas montarias e venham a pé!’. Na hora a ordem pareceu absurda. Onde iríamos deixar nossas montarias naquela mata? Aquiles sem querer provocar atrito com o guarani pediu para que descêssemos dos cavalos e os amarrassem nos troncos das enormes árvores. Depois, olhou para Enrico e disse para ele ficar de guarda.
Enrico não gostou da missão e perguntou porque ele deveria, um exímio na espada, ficar cuidando de cavalos enquanto eu iria com o grupo. Aquiles explicou que naquele momento precisaria de um cronista para registrar sobre o contato que teríamos com a tribo. Poderia ser útil mais tarde o que falássemos com eles, alem do mais, Michelangelo era melhor na espada que Enrico.
Depois de tudo decidido continuamos a caminhar com Buldica e o nativo guarani. Enfim, depois de alguns passos na mata chegamos na aldeia da tribo. Os nativos ficaram nos olhando com apreensão. O grupo realmente era numeroso, tanto, quanto as cabanas que víamos. Buldica nos relatou que eles são maioria na mata e se espalham por varias regiões. Ela também acrescentou que eles já tiveram contacto com Atila e seus soldados, porém assim como as amazonas, os expulsaram da região.
Um senhor entre os guaranis apareceu e com um enfeite feito penas coloridas e segurando um cajado estilizado começou a falar em seu idioma: gesticulava muito e parecia agressivo.
Suas mãos balançavam e apontavam para todo lugar. Buldica vendo que não entendíamos resolveu traduzir o que ele falava:
-         Eles querem saber se vós sois irmãos dos arautos de Tupã. Também querem saber se desejam tomar as terras deles e se irão mata-los como os outros tentaram!
Aquiles disse que não era a nossa intenção. Pediu para Buldica dizer também que nós trouxemos presentes para eles. Buldica traduziu para o guarani as palavras de Aquiles.
O guarani então gesticulou e falou outras palavras confusas. Buldica disse que ele queria ver o presente. Aquiles pegou de sua bolsa uma imagem de Nossa Senhora e a ofereceu ao nativo. Este recebeu, olhou e depois com um gesto estranho levantou a imagem para o alto e gritou para os seus companheiros. Todos começaram a gritar juntos.
Ele sorriu e falou palavras em seu idioma. Não entendíamos nada! Porém, parecia que ele gostou do presente. Buldica interpretou o que estava acontecendo:
-         Vocês fizeram a estatua da deusa das águas Yara, muito obrigado!
Aquiles não entendeu e disse que a imagem era de Maria-a mãe de Jesus-o nosso Salvador. Buldica explicou:
-         A mãe do seu deus é irmã da deusa Yara, a rainha das águas, pois são muito parecidas!
Nesse momento nos entreolhamos, pois, não entendíamos nada do que Buldica dissera. O velho então sorrindo nos convidou para entrar na aldeia. Buldica relatou para Aquiles que os guaranis não conseguiram aprender o idioma trazido por Atila, e como ele foi agressivo com eles o nativo fizeram revoltas até expulsa-los de suas terras. Aquiles percebeu que Atila poderia ter tido êxito em cristianizar os guaranis se não fosse a soberba.
O velho pajé então nos mostrou uma cabana cheia de crianças, mulheres e alguns varões. Eles estavam comendo em potes de barro e de cócoras no chão. Pareciam seres indefesos e incivilizados. Comiam com as mãos e não por muito poderiam ser confundidos com animais.
Aquiles olhou ao redor e viu que aquela comunidade tinha muito que aprender. Percebeu a sua inocência e falou para Buldica:
-         Eles estavam destinados a conhecer Jesus! Somente Deus nos guiaria para um local tão puro quanto este!
Buldica preocupada com a afirmação retrucou:
-         Cuidado! O seu deus já nos trouxe muitas dores.
Aquiles disse que desta vez tudo seria diferente. Realmente as coisas o foram, passamos inicialmente um ano e em seguida já era dois ou mais. No fim, estávamos adaptados ao clima e a vida dos nativos. Nadávamos nos rios e participávamos de seus rituais pagãos. Em contrapartida ensinávamos a rezar e a entender a Santíssima trindade. Os índios (começamos a chamar os nativos assim, pois com certeza deveríamos estar na Índia) começaram a confeccionar imagens de santos de barro e respeitar a cruz. Suas casas de palha passaram a serem feitas de tijolo cozido e começaram a edificar uma igreja.
Pensamos no inicio em fazer uma catedral como as francesas, mas o material não serviria para tanto: não tínhamos rochas mais duras que o mármore para tanto. Fizemos então uma igreja modesta, contudo digna para o Senhor Jesus!
Estávamos tão distraídos com a nossa catequese que a lembrança de Atila havia sumido de nossas mentes. Todavia, sabíamos Vossa Santidade que tínhamos que voltar para a missão. Aquiles o nosso líder estava mais velho, mas também mais sábio e muito forte devido o trabalho braçal de ajudar os nativos. Aprendeu a usar o arco e a flecha dos guaranis e passou a ensinar a eles a arte da espada. Para ele o tempo não passou e logo voltamos a ir no encalço dos renegados!

Helio Medeiros parou a leitura. A platéia continuava em silêncio. Helio olhou para todos e também surpreso com que lera começou a erudição:
-         Aqui podemos perceber a relação entre colonizador e nativo, a partir da forma de ganhar a confiança dos índios e como cristianismo se instalou em nossa cultura. O sincretismo religioso será a nossa marca cultural e Yara e Nossa Senhora se confundem em nosso inconsciente coletivo.
Em seguida pediu um copo de água e sentou em uma cadeira e começou a selecionar outros documentos para serem lidos para o publico.

O SORRISO MATREIRO

Com a platéia mais afoita e disposta a conhecer os documentos do monge franciscano, Helio Medeiros sentiu-se mais confiante para expor seus pensamentos eruditos sobre História e Arte. Brincou um pouco com a veracidade dos documentos e ironizava os acadêmicos que o haviam chamado de desvairado e suas teses de excêntricas.
A diretoria charmosa que o havia chamado a atenção quando entrou na faculdade, parecia fascinada pela imagem de homem culto que Medeiros tentava cultivar. Percebemos que isto lhe dava vantagem ele sorria matreiro para ela e esta correspondia como uma adolescente que se apaixonara pela primeira vez.
Então, voltando a si e onde se encontrava Helio deixou a mulher de lado e voltou para os documentos e se preparou novamente para ler.



EXORCISMO

Estamos comemorando a nossa quarta Páscoa na ilha. Para animar o festejo fizemos uma encenação da Paixão de Cristo. Os nativos ficaram fascinados como contávamos e interpretávamos a história do Salvador. Oh Vossa Santidade! Quanto orgulho teria em ver a nossa catedral: pobre diante de Santa Maria Del Fiore, mas gigante em humildade e perseverança.
Pedimos que os nativos façam pórticos góticos na entrada e colocassem relevos que relatassem o Juízo Final. Para o toque final colocamos gárgulas nas laterais das torres, para assim impedir a entrada do Maligno e dentro colocamos em vários pontos estratégicos do átrio imagens de São Sebastião, Nossa senhora e o Cristo Piedoso.
Os índios infelizmente não param de orar diante da imagem da Virgem e chamam-na de Yara. Por mais que tentemos consertar o equivoco, eles insistem em compara-las. Na verdade nunca vi tal divindade, pois percebemos que os nativos não faziam esculturas de seus deuses até nós chegarmos.
Para eles a floresta, seus animais e plantas são o seu templo. O que explica eles nunca terem edificado uma igreja para seus deuses. Penso que talvez, eles estejam certos em somente verem Deus com os olhos da alma e não com os olhos carnais e corruptíveis que necessitam de imagens e templos.
Monsenhor Aquiles e Michelangelo continuavam a treinar espada e a ensinar os índios as técnicas de batalha. Bonelli resolveu ensinar-lhes a plantar e colher coisas que os nativos não faziam. Aliás, percebo que tudo o que eles querem está próximo deles. Não seria este fator que lhes impediriam de plantar? Deus foi bondoso com eles: deu tudo o que necessitam. Sinto o pecado da Inveja entrar em meu coração e vossa santidade poderia ter o mesmo sentimento se visse o mundo exótico e calmo onde vivem: é o Éden do Criador citado no livro sagrado!
Todavia, nem tudo são flores! Tivemos que fazer uma limpeza espiritual pela região. Expurgamos criaturas malignas que contaminavam o Éden: havia uma raça de nativos de cabelos raspados e somente tinham uma crina como de cavalos e de dentes proeminentes como lobos. Os guaranis treinados por nós, nos levaram a aldeia deles para serem cristianizados. Eles zombaram da nossa catequese e riram de nosso Deus!

Enrico, sempre de pavio curto, castigou alguns deles a golpe de espada. Os nativos hereges resolveram reagir. Foi uma péssima idéia...Aquiles levantou a espada e como combatente que é, somente guardou a arma na bainha depois de derrubar uns vinte deles. Alguns nativos tiveram as cabeças decepadas, outros foram queimados em fogueiras por heresia e outros tiveram que ser exorcizados.
Vendo que não poderiam fazer nada os nativos de crina de cavalo se renderam e passaram a beijar a cruz. Depois continuamos e fomos à outra aldeia. Esta aldeia possuía uma tribo deveras estranha chamada de Curupira. Eram homens pequenos (quase anões) de cabelos vermelhos cor de fogo, pela alaranjada e com os pés invertidos como se andassem como caranguejos.
O seu linguajar era estranho até para os guaranis, porém se respeitavam. Aliás, as tribos pareciam se entender muito bem. Se não fosse por um problema... Os curupiras não gostavam de nós e também não quiseram receber Cristo em seus corações. Resolvemos então expurga-los com fogo e oração! Fizemos muitos exorcismos na aldeia e queimamos muitos hereges. Os curupiras não tinham nenhuma técnica de batalha e foram alvos fáceis para as nossas espadas.
No fim a aldeia foi tomada e eles resolveram se render prometendo seguir as leis do Altíssimo e seus representantes na terra. Passados alguns dias, nos deparamos com feras parecidas com as que encontramos quando chegamos na ilha. Eram enormes e bestiais! Grunhiam e arrasavam o que encontravam.
Os guaranis pelo jeito já os conheciam e com suas lanças e flechas mataram um grupo, de talvez, cinqüenta criaturas horrorosas. Depois de mata-los, queimamos os corpos e jogamos água benta no local para que ali não viesse a brotar do solo mais feras demoníacas.
Por fim, encontramos o tal cavalo sem cabeça que Fúria havia dito. Era um lindo alazão, seu tropel parecia tremer a terra e de sua cabeça cortada brotava um ramalhete de fogo amarelo que iluminava a mata como se fosse varias tochas juntas. Enrico fez uma armadilha para que a criatura caísse. Junto com os guaranis confeccionou uma rede e no chão, um buraco produziu.
Bonelli serviu de isca para atrair a criatura que sem pestanejar caiu na peça pregada. Indefesa depois de cair em um buraco e se atrapalhando em uma rede foi presa fácil para que Michelangelo a despedaçasse com machadadas e depois queimada com a água benta.
Eu poderia arrolar muitas outras historias, mas acho que estas ilustram muito bem o quanto pode ser perigoso viver aqui!   


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